A dança, a mais antiga das artes junto com a expressão corporal, são práticas milenares que transcendem barreiras do tempo, culturais e sociais, promovendo bem-estar e conexão entre as pessoas.
Esta atividade vem ganhando destaque na escola e em contextos inclusivos de educação não-formal, porém ainda observam-se barreiras a serem superadas quando falamos da expressão do corpo – o corpo que se move, o corpo como afirmação de identidade, o corpo na comunicação não-verbal. Em nossa sociedade, a educação, em sua grande maioria, ainda privilegia o intelecto, relegando o corpo e os aspectos criativos dos educandos a um segundo plano.
Ao abordarmos a primeira infância, poderíamos pensar na dança realizada no contexto familiar? Que tal dançar entre mães e filhos? Recentemente, publiquei o livro "Dance com Ele", fruto da minha tese de doutorado, para explorar práticas dançantes possíveis de serem realizadas pela díade mãe e filho, inclusive com deficiência ou transtornos do neurodesenvolvimento.
Sim, é possível. Todos podem e devem dançar, inclusive mães, pais, irmãos e seus filhos. Basta querer e acreditar nas inúmeras possibilidades e benefícios desta prática, que destaco abaixo:
A dança, enquanto expressão artística e corporal, facilita a criação de laços afetivos profundos entre mães e filhos, promovendo uma interação física e emocional única. A dança permite que mães e filhos compartilhem momentos de intimidade e cumplicidade, fortalecendo o vínculo afetivo. É uma forma de comunicação não-verbal que pode expressar sentimentos e emoções que muitas vezes não são facilmente verbalizados.
Além dos benefícios emocionais, a dança contribui significativamente para o desenvolvimento físico e psicomotor das crianças. Os movimentos rítmicos e coordenados da dança ajudam no desenvolvimento da coordenação motora, equilíbrio e consciência corporal. A repetição de sequências de movimentos auxilia na melhoria da coordenação motora global, essencial para o desenvolvimento de habilidades motoras finas e grossas. A prática regular da dança pode melhorar a concentração e a memória, proporcionando uma base sólida para o futuro aprendizado acadêmico da criança.
O desenvolvimento psicomotor é um dos aspectos mais importantes da infância, e a dança oferece uma maneira divertida, lúdica e envolvente de aprimorar essas habilidades. Movimentos como pular, balançar, girar e equilibrar ajudam na habilidade de planejar e executar movimentos complexos. O envolvimento das mães nesse processo é vital, pois elas podem observar e apoiar o desenvolvimento de seus filhos, ajustando atividades conforme suas necessidades, possibilidades e faixa etária, visando proporcionar um estímulo adequado.
O desenvolvimento do esquema corporal, definido como a percepção que uma criança tem do próprio corpo, de suas partes e de seus movimentos, é essencial para a realização de atividades cotidianas e é desenvolvido de maneira significativa durante a infância. Neste sentido, a dança desempenha um papel essencial ao possibilitar o movimento e a expressão de diferentes partes do corpo. Dançando, as crianças exploram diferentes movimentos e posturas, aprendendo a reconhecer e a controlar suas ações corporais.
A dança ativa áreas linguísticas por ser a linguagem do corpo, expressando diversos estados emocionais e situações através do movimento corporal e posturas ao interpretar determinada música. Ou seja, há uma mensagem que pode ser transmitida através do corpo. Neste sentido, a dança também pode auxiliar no desenvolvimento da comunicação e linguagem, inclusive ajudando crianças em condições de deficiência ou transtorno do espectro autista não-verbais a se expressarem, mesmo que não verbalmente.
A dança é uma ferramenta poderosa no desenvolvimento da autoestima e da autoconfiança, tanto para mães quanto para filhos. Ao participarem de atividades de dança junto com suas mães, ou até mesmo pais, irmãos, avós, as crianças aprendem a se expressar livremente, desenvolvendo um senso de identidade e autovalorização. A participação das mães nesses momentos é crucial, pois elas servem como modelos de comportamento positivo e incentivo, ajudando a construir um ambiente de apoio e confiança mútua.
A autoestima é fundamental para o desenvolvimento saudável das crianças, e a dança oferece um meio seguro para explorar e afirmar suas habilidades. Quando as crianças veem suas mães participando e se divertindo na dança, recebem a mensagem de que são aceitas e valorizadas pelo que são. Esta aceitação incondicional ajuda a construir uma base sólida de autoconfiança, essencial para enfrentar desafios e aproveitar oportunidades ao longo da vida.
Em um mundo cada vez mais estressante, encontrar formas de reduzir o estresse e promover o bem-estar é essencial. A dança oferece uma válvula de escape para o estresse diário, proporcionando momentos de alegria e relaxamento. A liberação de endorfinas durante a dança tem um efeito positivo no humor e na saúde mental, podendo ajudar a lidar com questões relacionadas à ansiedade e à depressão. Criando um espaço seguro e alegre para mães e filhos se reconectarem, a atividade física envolvida na dança também pode contribuir para a flexibilidade, alongamento e melhorar a qualidade do sono e o nível geral de energia. Para as mães, que muitas vezes enfrentam múltiplas responsabilidades e estresse diário, dançar com seus filhos pode ser uma forma revitalizante de recarregar energias e melhorar o humor.
A dança desempenha um papel vital na promoção da inclusão e socialização ao possibilitar o envolvimento de crianças de diferentes idades e habilidades. Isso não apenas promove a aceitação e a compreensão das diferenças, mas também fortalece a comunidade e o senso de pertencimento. Ao dançarem juntos, mães e filhos aprendem a colaborar, respeitar o espaço e o ritmo um do outro, e valorizar a diversidade.
Então, vamos dançar? Para praticar dança em casa, é importante certificar-se de estar em um local seguro, com um piso que não seja muito liso nem áspero, sem móveis ao redor, vestindo roupas confortáveis e utilizando música em volume adequado, evitando que seja alto demais para as crianças.
A prática da dança e da expressão corporal entre mães e filhos vai muito além de uma simples atividade recreativa. Esses momentos compartilhados são essenciais para o desenvolvimento emocional, físico e psicomotor das crianças, além de fortalecer os laços familiares. Em uma era onde a tecnologia muitas vezes substitui a interação humana, a dança oferece uma oportunidade valiosa para reconectar, expressar e celebrar a vida em família. Incorporar a dança na rotina familiar pode ser um passo essencial para mães e filhos, proporcionando uma relação afetiva rica em estímulos, vínculos, ludicidade, amor, confiança e alegria que certamente influenciará positivamente no desenvolvimento da criança.
*Texto escrito por Keyla Ferrari, colunista do Portal Primeira Educação*